quarta-feira, agosto 31, 2005

Reflexões

Se houve uma coisa que percebi no dia de ontem, é que são principalmente as pessoas que fazem os “lugares”.
As saudades que sinto de Portugal, não são reais… claro que sinto saudades de Óbidos, da Arrifana, da Moitalina e de Lisboa (algumas partes de Lisboa), sinto também saudades do pão alentejano, dos enchidos e dos queijos, do arroz de galinha, do bacalhau, etc etc etc.
Mas as saudades reais que tenho de Portugal são saudades das pessoas, não de todas é claro, mas de muitas, daquelas que foram e são minhas amigas, daquelas que um dia contribuíram para o meu crescimento e para a minha felicidade.
Não tenho saudades do ritmo, do estilo de vida, nem das rotinas, muito pelo contrário, acho que a vida aqui se adapta muito mais à minha pessoa.
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Agora, ainda sobre o dia de ontem, aqueles poucos que ficaram sentiram de repente um vazio nas suas vidas, partiram algumas das pessoas que, de uma forma mais intensa ou não, faziam parte do nosso dia-a-dia. E de um momento para o outro esta cidade mudou.
Adoro este lugar, cada vez gosto mais desta cidade, mas a vida que todos construímos aqui fazia muito mais sentido com todos os elementos que já partiram. Talvez eu seja a pessoa que estou mais segura de voltar a encontrar todos um dia mais tarde na minha vida, acho que a ligação que criei com alguns deles foi uma relação demasiado forte, que não é só deste tempo e deste lugar, é uma ligação que cresceu de tal forma que tem tudo para se manter para o resto da vida.
Há sempre pessoas, que conhecemos nas nossas viagens, que nos marcam, e essas pessoas geralmente marcam-nos por estarmos num lugar comum durante um tempo partilhado, nessa altura as pessoas encaixam perfeitamente connosco, no entanto nada nos garante que essas pessoas continuem a ser importantes para nós mais tarde.
Depois de regressarmos ao lugar de partida, tentamos reajustar-nos, e nesse processo temos necessariamente que largar algumas das coisas e pessoas que conquistámos, no entanto são sempre as mais importantes que ficam. E se as coisas mais importantes tiverem o poder de mudar a nossa vida, o reajustamento ao lugar inicial já não será tão fácil, podendo mesmo ser impossível.
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Digo isto porquê? Porque eu, tal como todos aqueles com quem tenho partilhado a minha experiência, mudámos. Nós olhamos uns para os outros e percebemos que estamos todos diferentes desde aquele dia que falámos pela primeira vez.
Mudámos por nos termos conhecido uns aos outros e por termos ficado com um pouco de cada um, mudámos porque o processo de troca é mútuo, porque crescemos juntos, porque demos uma passo gigante em frente na nossa vida, um passo maior do que o tempo que ficámos por cá. Mudamos também porque esta cidade, este país, estas pessoas, estas ilhas tão diferentes, nos fizeram olhar para o mundo, para a vida e para as coisas importantes, de uma maneira totalmente diferente. E acima de tudo mudámos porque agora nenhum de nós quer perder esta nova forma de olhar o mundo e a vida.

terça-feira, agosto 30, 2005

Big Brother no Mindelo

Porquê este nome para mais um post?
Porque apesar de não estarmos num concurso, a vida aqui está cada vez mais a assemelhar-se a esse programa de televisão.
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Ora vejamos, durante 9 meses encontra-se no Mindelo um grupo de 12 pessoas, 4 homens e 7 mulheres, de várias nacionalidades.
Neste caso a cidade e não as câmaras é que nos observam, sabem a nossa vida, conhecem os nossos passos, sabem quem somos, de onde viemos e o que estamos cá a fazer, sabem que este nosso “filme” é curto e observam com atenção cada minuto dele.
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Os objectivos inicias dos “concorrentes” são comuns: viver no estrangeiro, conhecer o mundo, ganhar experiência pessoal e até profissional, e claro conhecer novas pessoas.
Ao longo do tempo os objectivos foram aumentando, ficámos amigos, queremos continuar a manter o contacto, todos gostaríamos de continuar aqui, mas por factores diversos nenhum vai ficar. Resta saber quem chegará ao fim.
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Mas aqui o fim é ter o “privilégio”, ou não, de ser o último a partir e ver todos os outros a irem embora, participar e organizar festas de despedida, fazer um último brinde de cada vez que alguém parte, levar as pessoas ao barco ou ao avião, trocar os contactos e esperar que um dia seja possível que nos voltemos a encontrar, algures por esse mundo fora.
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Os concorrentes de idades entre os 23 e os 32 anos, na minha perspectiva, são/eram: Eu (Ana), Catarina, Ely, Joana, Laura, Orsola, Marta, João, Miguel, Fermin, Manolo e Zé. 5 portugueses, 4 espanhóis, 2 cabo-verdianos e 1 italiana.
Esta “Torre de Babel” que aqui se começou a construir está agora a chegar ao fim.
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No dia 10 de Agosto partiu a primeira pessoa, uma das mais importantes para mim nesta nova etapa da minha vida, a Laura. Senti com esta primeira partida a minha vida já tinha mudado desde que aqui cheguei. O processo de mudança que todos vivemos aqui foi sentido com mais intensidade no dia da partida da “mui limpita” Laura. Neste dia sentimos na pele que tudo o que é bom acaba depressa, e que por isso temos que aproveitar cada segundo dos dias felizes da nossa estadia aqui.
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Depois de 20 dias sem ninguém ter saído deste “barco”, pensávamos que já tínhamos escapado ao Big Brother, pensámos que já se tinham esquecido de nós. Mas afinal não, em vez de “expulsões” semanais, decidiram juntar uns quantos para sair todos juntos. E assim, hoje, dia 30 de Agosto, o barco levou para fora da ilha mais três concorrentes: a Joana, a Ely e o João.
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E as saídas ir-se-ão sucedendo até não restar mais ninguém aqui. Em Setembro devem ir a Catarina, a Marta e o Zé, a Orsola deve partir em Outubro (mas sem certezas ainda), tal como o Miguel e o Fermin (este último também sem certezas).
Depois em Novembro vou eu embora, deixando para trás apenas o Manolo, que há-de ficar cá a ver-nos partir e a ver chegar mais uma leva de gente, como tem vindo a ser habitual nesta cidade.

quarta-feira, agosto 24, 2005

7 Meses

Ao completar os 7 meses em Cabo Verde percebo que já passei várias fases de integração:
-Primeiro a chegada difícil, a cidade estranha, os olhares dos locais e dos vendedores julgando-me mais uma turista,
- Depois as primeiras conversas, a descoberta de locais e a criação de rotinas
- A meio do tempo comecei a reconhecer e a ser reconhecida na rua ou em qualquer lado, começaram a surgir os convites para tudo e mais alguma coisa, surgiram as músicas com o meu nome (Ana mata txuc…) e os telefonemas dos novos amigos
- Depois veio o sentir-me da terra e ser vista como mais uma pertencente à cidade…
- Agora já não preciso contar a minha vida… agora todos já sabem o que faço, por onde ando, quem sou… agora já pertenço demais aqui… tanto que preciso de espaço e de ficar por momentos sozinha, mas depois percebo que ambas as coisas são impossíveis de conseguir… Espaço??? Numa ilha pequena??? Ahahah??? Que piada… Ficar sozinha??? Não dá!!! Tentei um dia e conseguir encontrar apenas 4 pessoas conhecidas num espaço de 2 horas… Ok… percebo que era em parte isto que eu queria… e sabe-me bem… consegui, antes do meu tempo acabar, integrar-me na ilha que agora é a minha vida… E sou feliz aqui.

Emigrantes

O país de emigrantes… a comunidade cabo-verdiana espalhada pelo mundo é muito superior à que actualmente reside em território nacional… incrível não é??
Agora imaginem que destes emigrantes todos cerca de 1/3 decide voltar à terra natal durante o mês de Agosto???
No mínimo irreal… O país muda… enche-se de gente, de novas línguas (inglês, holandês, francês), enche-se de novos ricos que vêm exibir as roupas da moda, a música da moda, os brincos colares e pulseiras de ouro da moda, vêm tirar das garagens os imensos carros diferentes que durante o ano nunca se vêem, vêm passear na praça e reencontrar a família que é quase a ilha inteira, vêm com os respectivos companheiros para os apresentar ao país… Gente de todas as cores, de todos os feitios… gentes diferentes e no entanto tão iguais… somos todos Cabo-verdianos… até mesmo eu…
Olhando para esta cidade repleta de gente percebo aquilo que não percebi nem nunca vi em Portugal… um país igualmente de emigrantes… vejo as festas, as famílias reunidas, a ostentação de riqueza sem cuidado com a estética, vejo saudades, vejo a força de um povo que luta por viver melhor, um povo que mesmo lá fora não esquece o que está cá dentro…
Vejo os emigrantes americanos vestidos à gang com as camisolas de basquetebol, todos melosos, cheios de humanidade e de carinho a dançar o zouk com as meninas mais bonitas do Mindelo… afinal somos todos iguais…
Sento-me numa mesa de um qualquer restaurante e reparo que ao lado se fala bem alto uma língua qualquer estrangeira saída da boca de cabo-verdianos de gema, e que depois de uns copitos do melhor grogue velho a língua vai dobrando e deixando de resistir ao esforço de quem fala, começa a soar a crioulo… a língua deste povo.

Chuvas

No dia 21 de Agosto o tempo mudou… as nuvens que diariamente passavam bem alto no céu por cima desta terra sedenta de água, decidiram finalmente abrir-se a acariciar as encostas castanhas e a poeira no ar… Choveu finalmente durante mais de 1 hora, e a cidade ficou irreconhecível… o cheiro mudou, o ar deixou de estar seco, as ruas transformaram-se em rios e as casas ficaram lavadas por fora e por dentro também… Que dádiva, que milagre eu vi acontecer…
Mas por causa desta chuva… por causa de matar a sede da terra o calor decidiu apertar mais ainda…. Agora a temperatura está quase insuportável… está quente quente e tão húmido que me sinto permanentemente dentro de água… pareço um peixe que de repente tem que aprender a respirar… Escondo-me do calor durante todo o dia no meu escritório onde o ar condicionado quase derrete de tanto trabalhar, à noite de ventoinha ligada rezo para que corra uma brisa para poder descansar… mas passam as horas… tomo mais um banho… saio de casa outra vez para refrescar… a Duna desespera… nem se mexe… arrasta-se para dentro do frigorífico sempre que pode, e tentar tomar banho sempre que ouve a água correr em qualquer torneira lá de casa… São 2 da manhã e eu ainda estou acordada… já não aguento o colchão nem a almofada… deitar-me no chão??? É uma hipótese… acho que hoje é mesmo isso que vou tentar…

terça-feira, agosto 23, 2005

Festival da Baía das Gatas

Depois de tentar organizar a minha cabeça durante a semana a seguir ao fim-de-semana em Sandy beach, depois de tentar perceber como é que é possível que apenas alguns meses podem ser tão marcantes e sejam capaz de mudar uma pessoa… nem tive tempo para acabar de reflectir já estava eu no evento mais esperado do ano… o Festival da Baía das Gatas… 3 dias de acampamento na praia, 3 dias de música… (19, 20 e 21 de Agosto)
A música não foi o melhor… nem nada que se pareça… apenas gostei de ouvir Bau, Tcheka e Dubsquad… mas o ambiente era do melhor… um mar de gente, devia estar lá a ilha quase toda mais uns quantos que vieram de propósito para o festival… devíamos rondar as 70 000 pessoas, todas numa praia, na boa, a comer em mil e uma barraquinhas, a acampar no areal, a tomar banho e a lavar a loiça junto ao recife de coral, a comer pó, a dançar junto ao palco, cada um a curtir a sua onda, sem stress, tudo na boa. Depois da festa do palco terminar a festa continuava nas tendas, no recinto e nas Ruínas (discoteca improvisada nas ruínas de uma casa à saída da Baía das Gatas) e só acabava depois do amanhecer. Apesar de metade das pessoas terem decidido acampar no recinto durante todo o fim-de-semana, muitos eram os que iam e vinham da cidade (eu incluída) num qualquer transporte onde ainda me fosse possível encaixar… Hiaces, carrinhas de caixa aberta, autocarros… todos a abarrotar de gente, ultrapassando em muito o limite máximo de ocupantes… mas por apenas 100$00 todos entravam para chegar o mais rápido possível ao recinto do festival. O único caminho que liga a cidade à Baía estava cheio de carros em caravana… nunca pensei ver tantos carros juntos nesta ilha, aliás nem sequer sabia que havia tantos carros aqui… quase parecia o trânsito que se apanha em Lisboa fora das horas de ponta (estávamos sempre a andar em fila ordenada e compacta).
O festival correu bem, encontrei um monte de gente conhecida de todas as idades, desde o pessoal do trabalho até aos meus senhorios… a ilha em peso está lá.
O único senão do festival foi o assalto… pela primeira vez na minha vida fui assaltada… foi muito estranho… como é possível que no meio de tanta gente ocorra um assalto??? Eu e a Catarina ficámos sem dinheiro, mas foi possível ficar com o resto das coisas após “negociações” com os indivíduos… a minha máquina fotográfica e o meu telemóvel salvaram-se e desataram em fuga nas minhas mãos… Não passou de um valente susto… está tudo bem… Depois de me encontrar “no colo” dos meus amigos, entrei numa das carrinhas e fiz o caminho de regresso a casa… eram 6:30 da manhã quando finalmente tudo acalmou… do dia seguinte foi o balanço, a queixa na polícia e a lavagem da alma… Choveu no Mindelo pela primeira vez desde que cá estou…

segunda-feira, agosto 22, 2005

Body board em Sandy Beach

Nos dias 13 e 14 de Agosto a procissão marchava toda em direcção a Sandy Beach para assistir ao evento mais esperado no mar de S. Vicente… o campeonato de Body board e Surf… e eu estava lá…
Não… eu não participei no campeonato… ainda mal sei apanhar ondas…e os tipos que participaram são uns cromos… são mesmo muito bons… parece que nasceram em cima de uma prancha.
Eu estive lá… só estive lá… conheci muita gente, reforcei muitos laços de amizade, dancei, cantei, comi peixinho grelhado, contei as estrelas, dormi à beira das ondas com o som a embalar… tirei um monte de fotografias… e ainda tive direito a uma declaração de amor e uma serenata ao luar… (infelizmente o tipo que se declarou é uma chaga monstra… insuportável… mas á conta dele temos rido às gargalhadas desde esse triste momento oportunamente registado pelo Manolo em vídeo e em fotografia)
Quando estava lá pensei em muitos de vocês… como gostaria que estivessem ali comigo… muitos iam adorar… Na altura lembrei-me de uma data de coisas que vos queria contar e partilhar sobre o que vivi naquelas 48 horas, mas agora não consigo transmitir o como foi importante para mim ter estado a dormir na areia entre o mar e a fogueira tendo como tecto o luar…

domingo, agosto 21, 2005

Tubaroa

Duna dentes de tubarão, este é o novo nome da minha gata…
a bichana decidiu mudar de dentes este mês (passar de dentes de leite para dentes definitivos), mas em vez do fenómeno normal de caírem os dentes de leite um a um e nascerem depois os definitivos, o processo foi mais ao estilo tubarão…
os dentes nasceram ao lado dos outros sem que estes caíssem…
dentição dupla é características dos grandes predadores, nomeadamente tubarões… por isso a Duna agora é Tubaroa…

sábado, agosto 20, 2005

Cabelo

O corte de cabelo… radical no mínimo… louco??… alucinado???
Estava-me mesmo a apetecer… aqui já posso tudo, já me sinto em casa…
Cortei o cabelo bem curto, entreguei-me nas mãos de uma argentina que decidiu morar aqui… a tesoura dançou-lhe nas mãos melhor do que dançaria nas mãos de um qualquer cabeleireiro de uma capital europeia… e este corte podia ter sido feito em qualquer cidade louca e gigante… mas foi feito aqui… numa cidade pequena, numa ilha pequena, onde a moda depende do que os chineses conseguem trazer da china…